«Amália Hoje», Hoje
Pedro Figueiredo
A ideia foi homenagear Amália. Dar-lhe uma alma pop em 2009, fazer de canções de sempre, intocáveis, hinos pop contemporâneos. Nuno Gonçalves, dos The Gift, foi o maestro por detrás de uma equipa de luxo que desde a primeira faixa desenha um triunfo apenas ameaçado em breves momentos.
Nuno Gonçalves e Sónia Tavares, ambos dos The Gift, Fernando Ribeiro, dos Moonspell, e Paulo Praça, dos Plaza, são nomes há muito consolidados no panorama musical português, ponto assente. De escolas diferentes, certo, todavia ligados por diversos trajectos percorridos na mesma época, ou não falássemos nós de músicos nascidos artisticamente na década de 90 e ainda hoje actores principais da primeira liga musical portuguesa.
«Amália Hoje», o disco, surge no ano do décimo aniversário da morte da fadista, figura incontornável do Portugal que se faz de música mas não só: de cultura, de sociedade. O desafio lançado pela Valentim de Carvalho a Nuno Gonçalves não foi aceite de imediato, e não custa perceber porquê: mexer no legado de Amália é (era?) mexer no sagrado, no intocável, na memória colectiva do povo.
A formação dos Hoje, repartida em três vocalistas poderá gerar comparações com o projecto Humanos, idealizado por Nuno Rafael para trabalhar em canções nunca editadas de António Variações, mas as comparações findam aí: «Amália Hoje» ousa baralhar e voltar a dar canções conhecidas da diva portuguesa, gesto ousado e bem sucedido no afastamento total das formas musicais cantadas por Amália, um dos objectivos do grupo desde o começo.
Se Sónia Tavares e Paulo Praça, pelas suas ligações à pop, são intérpretes de escolha menos ousada, já a presença de Fernando Ribeiro surpreende: de facto, não é todos os dias que um vocalista de heavy-metal integra uma banda pop a recriar fados cantando uma…bossa nova. Elogie-se em particular o vocalista dos Moonspell pela dose extra de coragem.
E as canções? São nove, e podem ser divididas em três categorias: a primeira, incorporando «Fado Português», «Gaivota», «Medo» e «Foi Deus» pode ser caracterizada como de destaque maior às cordas, a grandiosas cordas, tonalidades épicas já utilizadas pelos The Gift embora num registo menos intenso. Não por acaso, Sónia Tavares é a intérprete principal das quatro faixas. «Grito», «Formiga Bossa Nova» e «L`important c`est la rose» formam o bloco menos expansivo do disco, de maior serenidade. Já «Nome de Rua» e «Abandono», esta última a fazer lembrar as explosões rítmicas dos Arcade Fire, são os momentos mais festivos de «Amália Hoje», curiosamente os de menor impacto a nível de arranjos.
«Amália Hoje» pretende ser um disco para todos, do mais purista dos entusiastas do fado ao jovem desconhecedor da obra de Amália Rodrigues mas curioso pela produção musical portuguesa da actualidade. As opiniões não serão consensuais, mas louve-se o risco – os Hoje podem não durar mais que isto em disco (não vão durar) e podem não passar «Amália Hoje» para palco (é provável que ao façam), mas conseguiram o nobre feito de, partindo de uma homenagem, construir um trabalho plenamente válido mesmo quando ouvido fora do seu âmbito de criação. E as cordas, aquelas cordas, valem metade do disco.
Pedro Figueiredo
A ideia foi homenagear Amália. Dar-lhe uma alma pop em 2009, fazer de canções de sempre, intocáveis, hinos pop contemporâneos. Nuno Gonçalves, dos The Gift, foi o maestro por detrás de uma equipa de luxo que desde a primeira faixa desenha um triunfo apenas ameaçado em breves momentos.
Nuno Gonçalves e Sónia Tavares, ambos dos The Gift, Fernando Ribeiro, dos Moonspell, e Paulo Praça, dos Plaza, são nomes há muito consolidados no panorama musical português, ponto assente. De escolas diferentes, certo, todavia ligados por diversos trajectos percorridos na mesma época, ou não falássemos nós de músicos nascidos artisticamente na década de 90 e ainda hoje actores principais da primeira liga musical portuguesa.
«Amália Hoje», o disco, surge no ano do décimo aniversário da morte da fadista, figura incontornável do Portugal que se faz de música mas não só: de cultura, de sociedade. O desafio lançado pela Valentim de Carvalho a Nuno Gonçalves não foi aceite de imediato, e não custa perceber porquê: mexer no legado de Amália é (era?) mexer no sagrado, no intocável, na memória colectiva do povo.
A formação dos Hoje, repartida em três vocalistas poderá gerar comparações com o projecto Humanos, idealizado por Nuno Rafael para trabalhar em canções nunca editadas de António Variações, mas as comparações findam aí: «Amália Hoje» ousa baralhar e voltar a dar canções conhecidas da diva portuguesa, gesto ousado e bem sucedido no afastamento total das formas musicais cantadas por Amália, um dos objectivos do grupo desde o começo.
Se Sónia Tavares e Paulo Praça, pelas suas ligações à pop, são intérpretes de escolha menos ousada, já a presença de Fernando Ribeiro surpreende: de facto, não é todos os dias que um vocalista de heavy-metal integra uma banda pop a recriar fados cantando uma…bossa nova. Elogie-se em particular o vocalista dos Moonspell pela dose extra de coragem.
E as canções? São nove, e podem ser divididas em três categorias: a primeira, incorporando «Fado Português», «Gaivota», «Medo» e «Foi Deus» pode ser caracterizada como de destaque maior às cordas, a grandiosas cordas, tonalidades épicas já utilizadas pelos The Gift embora num registo menos intenso. Não por acaso, Sónia Tavares é a intérprete principal das quatro faixas. «Grito», «Formiga Bossa Nova» e «L`important c`est la rose» formam o bloco menos expansivo do disco, de maior serenidade. Já «Nome de Rua» e «Abandono», esta última a fazer lembrar as explosões rítmicas dos Arcade Fire, são os momentos mais festivos de «Amália Hoje», curiosamente os de menor impacto a nível de arranjos.
«Amália Hoje» pretende ser um disco para todos, do mais purista dos entusiastas do fado ao jovem desconhecedor da obra de Amália Rodrigues mas curioso pela produção musical portuguesa da actualidade. As opiniões não serão consensuais, mas louve-se o risco – os Hoje podem não durar mais que isto em disco (não vão durar) e podem não passar «Amália Hoje» para palco (é provável que ao façam), mas conseguiram o nobre feito de, partindo de uma homenagem, construir um trabalho plenamente válido mesmo quando ouvido fora do seu âmbito de criação. E as cordas, aquelas cordas, valem metade do disco.
in diariodigital.sapo.pt
O que eu digo? Primeiro estranha-se, depois entranha-se...
Sem comentários:
Enviar um comentário